A proposta de Michel Temer para a
reforma da Previdência prevê que a aposentadoria especial para
trabalhadores rurais, na prática, deixe de existir.
Ou seja, terão que atingir idade
mínima de 65 anos, além de 25 de contribuição mínima. Hoje, ela – que
equivale a um salário mínimo – pode ser requerida ao se completar 60
anos (homens) e 55 (mulheres), bastando a comprovação do trabalho no
campo. A aposentadoria por tempo de contribuição é possível a partir de
15 anos de pagamentos.
Enquadram-se pequenos produtores
rurais (que já devem contribuir, aliás, com o INSS no momento da venda
de seus produtos), trabalhadores rurais, seringueiros, pequenos
extrativistas vegetais (como catadoras de babaçu), pescadores
artesanais, ou seja, o pessoal que bota a comida em nossa mesa ou
garante, através de seu suor a produção de commodities utilizadas para a
produção de alimentos industrializados, vestuário, energia, veículos.
Não importa que o desgaste dos
trabalhadores rurais, não raro, seja maior que a dos urbanos e sua
qualidade de vida menor. E, portanto, tenham uma expectativa de vida
mais curta, de acordo com dados do IBGE e do IPEA, aproveitando menos de
sua aposentadoria.
Também pouco importa que a
aposentadoria rural – o primeiro grande programa de distribuição de
renda do país – tenha garantido a subsistência de milhões de famílias no
campo por décadas.
E dada a informalidade do trabalho
rural (e a falta de investimentos de sucessivos governos para aumentar o
poder de fiscalização a fim de combater a sonegação), muitos são os
que, contratados informalmente, não conseguirão comprovar um quarto de
século de contribuição.
Seja pelo limite maior de idade ou
pelo tempo de carregamento do sistema, as mudanças serão um impedimento
para que o pessoal do campo se aposente. Mas, como já diria uma frase de
caminhoneiro da qual Temer afirmou ser fã: ''Não pense em crise,
trabalhe''. O que, para ele, é fácil, uma vez que se aposentou aos 55
anos, como procurador de São Paulo, recebendo mais de R$ 30 mil mensais.
Como já disse aqui, a proposta
apresentada por seu governo para a reforma da Previdência Social
considera que o Brasil é um grande escritório com ar condicionado, água
mineral em copinho reciclável e mobiliário ergonômico, com polpudo
tíquete-refeição, bônus no final do ano e previdência privada
complementar.
Essa é a única justificativa para
desconsiderar que há milhões de trabalhadores braçais de Estados com
baixo índice de desenvolvimento humano, como o Maranhão, cuja
expectativa de vida é pouco maior do que os 65 anos da proposta de
reforma.
Muitos dessas pessoas começam a
trabalhar antes mesmo da idade mínima de 14 anos prevista por lei (como
aprendiz) e, aos 18, já cortavam 12 toneladas de cana de açúcar
diariamente, queimavam-se produzindo carradas de carvão vegetal para
abastecer siderúrgicas e limpavam pasto ou colhiam frutas sob um sol
escaldante.
Óbvio que precisamos discutir a
Previdência e buscar novas regras diante do envelhecimento da população,
mas isso não deve ocorrer às pressas e às custas de quem coloca comida
em nossa mesa ou produz nossa matéria-prima, morrendo mais cedo por
isso.
O ideal seria, antes de anunciar uma
reforma da Previdência Social, propor medidas para incrementar a
qualidade do trabalho no Brasil, melhorando o salário e a formação de
quem vende sua força física, proporcionando a eles e elas qualidade de
vida – seja através do desenvolvimento da tecnologia, seja através da
adoção de limites mais rigorosos para a exploração do trabalho. O que
tende a aumentar, é claro, a produtividade.
Mudar a aposentadoria dos
trabalhadores rurais dessa forma pode, inclusive, fazer com que
intensifique-se o êxodo rural na busca por empregos que garantam a
subsistência negada inchando ainda mais as periferias das grandes
cidades.
Previdência não é para dar lucro ou
mesmo empatar. Não é banco, apesar do desejo de muitos. Deve cumprir uma
função social e ser um instrumento para garantia da qualidade de vida
de um povo – o que inclui redistribuição de riqueza.
Coisa que, por aqui, é pecado maior do que condenar trabalhadores rurais idosos a morrerem no meio de uma plantação.
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FONTE: Leonardo Sakamoto - Blog do Sakamoto, no UOL |
Espaço voltado para divulgar as ações dos Sindicatos dos Agricultores Familiares do RN filiados a FETARN e CONTAG.